sábado, março 31, 2007






Esta semana parodiei um pouco a desorganização do serviço. Não se confunda isso com falta de qualidade. Que é altíssima. Tem vários especialistas que são do top em diferentes áreas. E estão sobretudo rotinados para ensinar os mais novos. A título de exemplo, tive um dos attendees a "perder" mais de uma hora com um dos residentes. A dissecar toda a anatomia dum tornozelo. Lateral. Medial. Compartimento anterior. Posterior. Seio do tarso. Ligamentos. Pontos a reter. Formas de sistematizar a observação. Formas de relatar. Que sequências são importantes para que estrutura anatómica. Que sequências são importantes para documentar patologia.

A minha surpresa é que não tem a organização "escandinava" de São Francisco. São mais à nossa imagem. Têm mais problemas informáticos. Os computadores também sabem o que é bloquear. O sistema de teaching files deles é anacrónico (e penoso para mim que estou agora ligado a ele). O reconhecimento de voz deixa-os à beira de um ataque de nervos (mas quem passa as torturas da qualidade de alguns relatórios transcritos em Portugal...). O sistema de videoconferência por vezes não arranca, deixando conferências penduradas...

É também comum ver o gozo que relatar lhes dá. O vigor com que "atacam" um caso mais difícil. Como o discutem nas terríveis reunião de serviço das 7 da manhã, como telefonam uns aos outros para tirar dúvidas, para mostrar uma imagem. Como "googlam" uma dúvida. Fazem portanto parte de um hospital universitário por excelência. E de excelência.

Prémio Porque Blogar É Isto Mesmo

quinta-feira, março 29, 2007

Prémio Teclado Gorduroso

Por que razão o americano que trabalha não pode dar-se ao luxo de almoçar longe do local de trabalho? No nosso caso, longe da sala escura, da consola e do rato do computador? Por que razão ou trazem o farnel de casa, a sanduíche da loja da esquina, o gaspacho ou a comida do dia anterior numa lunch-box por aquecer e com mau aspecto e têm que comer no mesmo sítio em que passam o dia todo?

Saberão o que é intervalo? O que é descansar? O que é relaxar? Ainda vou tentar ensinar-lhe o que é isso e o que é a siesta!!!

Para piorar o mau aspecto daquele que comem, onde comem, com a velocidade que comem, a fazer o fazem enquanto comem, está mesmo o cheiro. Péssimo. Sempre ao mesmo Com um toque a tomate ácido. E a comida oriental. E a comida italiana rasca. E com um traço de comida para cão. Ou pior. Como ainda hoje... Penso a Patroa e a Clarinha têm melhor sorte!!!

Prémio Brancas PF

Mais do que o dólar, a NBA, a Estátua da Liberdade, o Empire State Buildin, a Bagel, o Mickey Mouse, o Super-Homem, a White and Stripes, o McDonalds, o Starbucks, a CNN, a GAP ou Levis, o churrasco, Wall Street, as Pretzel, Holywood, o Marlboro Man, e o Michael Jordan, sim mais do que isso tudo, a verdadeira “instituição” americana, que une velhos e novos, pobres e ricos, cultos e analfabetos, brancas, amarelhos, orientais, pretos ou hispânicos é a sapatilha. Qualquer que ela seja. Sneakers, all-star, jogging, basquetebol. Mas sobretudo a tipo ténis. Branca, de preferência.

Prémio Instituto Ricardo Jorge

Nunca vi tanta gente com doenças neuromusculares, marcha espástica, displasias várias, facies estranhos, dismorfias... Tenho uma teoria que ficará por provar. Mas o facto de haver tantas populações “ortodoxas”, muitas delas com acasalamento entre si, condiciona marcado inbreeding ou endogamia. Isto é, o pool genético encontra-se fechado nele próprio e as doenças hereditárias esquisitas e raríssimas acabam por vir ao de cima. Nova Iorque deve ser então o paraíso dos geneticistas e dos especialistas em displasias ósseas e síndromes polimalformativos.

Prémio Goodfellas

Sotaque de Brooklin, como que comendo os erres... Afinal o sotaque dos mafiosos dos filmes de Scorcese vem mais de Brooklin que das potenciais origens italianas. O chefe cá do Hospital for Joint Diseases, encarna a figura de judeu nascida e criada em Brooklin, Long Island, com pronúncia tão marcada que, à primeira,confundi com problemas de dicção e o rotulei de fanhoso. Suspeitei que tivesse tido uma fenda palatina. Mea culpa... Foi completamente ao lado. É mesmo fala local. Cerrada. Como quem combina entre dentes quando é que vai ser o próximo assalto. Brooklyn accent. Marcado. Ao ponto dos próprios residentes não perceberem o que diz...

Prémio Já Só Falta a Bragaparques

Conferências canceladas. Sistemas de reconhecimento de voz anacrónicos, computador ruidoso que parece que vai levantar voo, relatórios em atraso, informação clínica pouco detalhada. Funcionários que desatam aos berros de um lado do serviço para o outro para perguntar sobre este ou aquele doente. Acession numbers que não funcionam. Doentes à espera na consulta. Relatórios manuscritos enviados por fax. Claro que estou a parodiar e a escolher pequenas excepções que fazem, às vezes, deste pequeno rectângulo perdido no sul de Manhattan algo de parecido com o Hospital de Asprela.

quarta-feira, março 28, 2007

Shabbat - Wikipedia, the free encyclopedia


Shabbat - Wikipedia, the free encyclopedia: "Shabbat (Hebrew: שבת, shabbāt, 'rest'; Shabbos or Shabbes in Ashkenazic pronunciation), is the weekly day of rest in Judaism. It is observed, from before sundown on Friday until after nightfall on Saturday, by many Jewish people with varying degrees of involvement in Judaism."

É engraçado que sendo NY muitas vezes vista como uma das "capitais do mundo livre", seja também dos locais onde a influência das religiões se faça sentir duma forma tão palpável e ubíqua. E esta presença constante traduz muitas vezes as tendências mais ortodoxas e mais reaccionárias de cada uma delas. O exemplo mais característico são os judeus. Vestidos de preto. A rigor. Com o “chapéu” preto. O cabelo rapado atrás. E os cachos de caracóis de lado. Já os apanhei encostados a um canto do hospital, com umas fitas enroladas na cabeça e no braço e que se desprendia de um paralelepípedo qual pisa-papéis, colocado como aquelas lanternas usadas na testa (região frontal, para o radiologista), mexendo-se em movimentos pendulares ora anteriores, ora laterais. Depois sentando-se. Debruçando-se. Orando. Rezando. Sussurrando. Estremendendo. Pegando no livrito de orações (a Tora?). E depois novamente o estremecimento.
Outros que não dispensam o Yarmulke ou Kippa, um pequeno capuz que tapará a careca dos menos felizes, que eles prendem com um gancho e que os leva a pender a cabeça como se não aguentassem o peso... Pode parecer brincadeira, mas muitas vezes adivinho naqueles que vejo de frente, se este ou aquele personagem traz ou não o preservativo pela forma como parece carregar o mundo na cabeça ou às costas.
Outro exemplo é o caso do libanês do meu serviço, que sendo árabe, transporta um nome grego, que deriva do responsável da congregação cristã ortodoxa ao qual o tio pertence, ou pertencia, não percebi muito bem!

Mesmo na Net já encontrei resquícios reliosos em críticas a este ou aquele café, ora por que um é anti-palestiniano, o outro é pró-israelita... Entendam-se!!!

Até agora, e talvez por que estou num hospital nova-iorquino, quase todos os nomes que encontro são judeus. São os Glazer, os Goldberd, os Rosenberg, os Ginsberg, os Schweitzer,os Mechlin, os Cohen, osAmis, os Naidich... São frequentes as conversas em hebraico.

Por isso transcrevi o que diz a Wikipedia do Sabbath, o feriado semanal judaico, levado à risca por muitos. Nada de trabalho. Nada de máquinas. Jejum à risca. Nada de sexo. Nada de álcool.
No hospital da Universidade de Nova Iorque (NYU) os elevadores “respeitam” a religiosidade destas gentes. Por isso, entre o anoitecer de sexta e a tarde de sábado, entram em regime automático. Abrem as portas no rés do chão e primeiro piso e disparam até ao 16º. Daí retornam, aos bochechos, parando em todas as estações e apeadeiros. Sim. Em todos os pisos. Para que o crente possa utilizar o elevador sem pecar. Sem ter que pressionar o botão. Basta dar um passo.
Se isto não é prestar uma rasteira aos Deuses, não sei o que é...

terça-feira, março 27, 2007

O outro pé da Sereia de Mia Couto

Quem acha doce a terra natal ainda é um tenro principiante;
aquele para quem toda a terra é natal já é forte;
mas é perfeito aquele para quem o mundo inteiro é lugar estrangeiro.
a alma tenra fixou o seu amor num único ponto do mundo;
a pessoa forte estendeu o seu amor a todos os lugares;
o homem perfeito extinguiu o seu.

Hudo de St. Vitor - Monge saxão do século XII

segunda-feira, março 26, 2007

Prémio Sem Comentários



Podia escrever uma diatribe mal humorada e desgostosa. Podia... se o resultado não fosse tão ridículo. E ofensivo. Afinal de contas ainda estamos parados no tempo. Apesar dos telemóveis e da Internet. Já só falta o Benfica ficar campeão!

domingo, março 25, 2007

Prémio Victoria Secret


Para além do começo de dia com uma bagel com cream cheese, dum almoço celebrando uma sande de pesto e galinha irrepreensível, do jantar maravilhando-me com ensopado de veado num restaurante francês perdido num arrabalde de Chelsea, este sábado nova iorquino ficou ainda melhor composto com a visão ou a miragem do lanche... À minha frente encontrava-se um oriental gordo, efeminado, com aquelas t-shirts que se ajustam à forma da barrigona. Conversava histérico com uma rapariguinha de calça de ganga justa e All-Star branca. Era só uma das top das revistas, uma menina Victoria Secret, talvez um dos mais belos "exemplares " da beleza feminina... Sempre são razões para gostar mais de NY!

Estou prestes a vender-me. Ou melhor, já me vendi. Ao diabo. Passo a explicar...
Uma das cadeias americanas mais ubíquas é a Starbucks, rede de cafés mais ou menos anódinos, “empacotados”, normalizados, que pontuam muitas das esquinas americanas.

Acontece que em São Francisco havia anticorpos contra esta macdonalds dos expressos ou cappuccinos. Havia inclusive militância anti-Starbucks, vendendo-se T-shirts com dizeres, inclusive. E aceita-se perfeitamente.

Com a profusão de cafés locais giros, cada qual com os seus ritos específicos, a clientela definida, frequentados por tribos mais ou menos heterogéneas, estes cafés com alma serviam de ponto de encontro, local de trabalho, de relaxamento ou leitura. Reforço agora aquilo que já tinha escrito, com a sensação que os cafés de bairro, de esquina, com carácter, com temperamento, com virtudes e defeitos eram uma das mais valias de São Francisco. E poderia nomear uma série deles que me marcou, onde pude observar, conversar, estudar, escrever no blog, ler, rever artigos ou falar no Skype.

É verdade que ainda levo muito pouco tempo de Nova Iorque. Ainda não conheço nada. Tem sido trabalho-casa, casa-trabalho. E tenho andado mais pelo “centro” dos arranha-céus e das “quintas” avenidas.

Mas ainda não encontrei um café que me satisfizesse. E muito menos algum pelo qual me tenha enamorado. Primeiro porque quase não existe conceito de café. Existem cafés-restaurantes ou Starbucks. Ou aqueles outros também de bairro, mas parecendo corredores, em que as mesas estão apenas para justificar o espaço não ocupado pela montra ou pelo balcão.

Já para não falar na música. Não me lembro dum café em Frisco em que a música não fosse de excelente qualidade. Top-end. Por aqui tenho tido azar. Música excessivamente alta, não propriamente pimba, mas antes pop pindérica. São os cafés MTV...

Por isso hoje, depois dum brunch num restaurante giríssimo, numa boulangerie onde comemos das melhores sandes de pesto e galinha que é possível imaginar, e de andar a penar ao frio e chuva pelas ruas do Soho, à procura dum café onde pudesse abrir um computador, desisti e vendi-me. Ao Starbucks. E a uma música ranhosa.

sábado, março 24, 2007

Prémio Americanices

Americanices…

Dezenas de carros da polícia, com a parafernália luminosa no seu esplendor, em Times Square, todos aprumadinhos, paralelos, de esquina para o passeio, de um e do outro lado da rua. Polícias dentro e fora dos carros, confraternizando com os americanos orgulhosos e os turistas aparvalhados. Quando digo dezenas, não é por força de expressão. Nem mania das grandezas. Nunca tinha visto tanto “policial” junto. Segundo soube, não passou disso mesmo. Americanices. Exibição. Ou publicidade. Rotina. Da NYPD. Na hora da retirada, imitaram aquelas meninas da natação sincronizada. Sem aquele sorriso idiota, mas igual precisão. Carrinhos um a um, os deste lado para a direita, os outros para esquerda, em ritmo cronometrado.
Americanices II…

Há elevadores e elevadores. Este era americano em todo o seu esplendor. Um cromado sem mácula. Tamanho qb. Televisão. Ou computador. Ou híbrido. Com notícias gerais. Bolsa. Meteorologia. Ainda bem... Imaginem que desperdiçava os 20, 30 segundos que demorei a chegar ao 16º piso! Já para não falar no regresso à Terra...
Americanices III…

Na estação de metro de Times Square vi aquilo que poderia encontrar na medina de Meknes, numa aldeia perdida dos Andes ou num mercado do Sudoeste Asiático. Numa daquelas tabacarias manhosas, um empregado paquistanês, indiano ou do Bangladesh assistia um dos clientes no funcionamento de uma máquina bafienta e artesanal de plástico. Sim. Debaixo de terra, na estação de metro mais concorrida desta cidade de 10 milhões de habitantes, com milhares de pessoas a convergirem e divergirem por minuto, naquela encruzilhada de vias pedonais, acessos múltiplos a múltiplas linhas de metro, palco para artistas em projecto, acções de protesto, evangelizadores, pedintes e carteiristas, turistas em passo mais vagaroso e dissonante, em plena hora de ponta, quando o cansaço pesa já toneladas sobre milhares de rostos e ombros anónimos, um qualquer cidadão sul-americano encostava-se ao balcão da dita tabacaria, com uma máscara de oxigénio, fazendo ao mesmo tempo uma nebulização, enquanto assumia o papel de mirone e prestava-se, ele próprio, ao voyeurismo dum português sem câmara fotográfica.

quinta-feira, março 22, 2007

A temperatura pulou de 2 para 19º. E o vento gélido cessou. Tudo isto seriam óptimas notícias não fora o facto de acordar às 6 da manhã e demorar aproximadamente 45m a 1 hora em trânsito, o que me coloca num estado estuporoso, de anseio permanente por um sofá ou uma cama. Não há Soho, Central Park ou Tribeca para ninguém. Apenas o metro. Deixar a mochila à porta. Descalçar os sapatos. E dormir. Até já!

quarta-feira, março 21, 2007


É simples. Fica mais barato que o novo livro do Stoller, que custou os olhos da cara. E tem a vantagem de se merecer o purgatório, ganhar a inimizade da igreja de Bento XVI e ficar com o direito (vitalício, presumo) de não comungar. Ámen.

terça-feira, março 20, 2007

Prémio


Deambulei do hospital até Times Square. Foram aproximadamente quatro quilómetros e meio sem rumo. Ou melhor ia virando sempre para norte e para oeste mas duma forma pouco consistente. Apenas farejando as ruas. Seguia cores, pessoas, movimento, padrões. Com instinto. Só assim se justifica que, sem bússola, sem mapa, sem premeditação ou sentido de dever, ao acaso, ao calhas, à sorte ou por destino o tenha encontrado. Faz sentido então colocar a fotografia e, claro está, o vídeo que já vem dos tempos do antigo Alien.

Prémio O Próprio No País do Borat

O chefe teve hoje que interromper o trabalho para ir cortar o cabelo. Chegou depois a queixar-se que não havia qualquer cabeleireiro naquela área da cidade que não fosse do Uzbequistão. Enumerou rapidamente pelo menos meia dúzia deles. Mas engraçado é que não é são realmente uzbeques... Não. Pelos vistos são até velhos judeus russos, com passagem pelo país do Borat!

Mais o maior problema, para além da qualidade artística intrínseca do trabalho (isto já sou eu a meter a colher), é que todos eles optam por passar intensivamente (ou será ostensivamente?) música tradicional uzbeque, o que obrigou “O Próprio” a acrescentar um cocktail de medicamentos analgésicos à já clássica Coca-cola, para fazer face à enxaqueca.

Prémio É o Próprio II

Começa a beber diet coke às 7 da manhã (no mínimo!!!) e acompanha os casos bebericando mais ou menos a propósito... Segundo as estatísticas do próprio, atinge um máximo de 10 Diet Cokes/dia no Verão! Ainda estou para saber o que irá fazer do LBV que lhe trouxe. Não vem em lata, não é light, não está pasteurizado ou esterilizado, foge à padronização e escapa aos seus números ou percentagens.
Tudo se transforma estatística na sua boca.

Esta lesão tem 75% hipóteses de ser metástase enquanto aqueloutra que está mesmo ao lado tem 60%.
Tudo tem critérios e está numerado. Há 6 articulações com menisco, 5 causas para edema de côndilo medial do fémur, 4 critérios descritos para estabelecer instabilidade da coluna cervical publicados em 1978 por Punjabi e qualquer coisa. O conhecimento enciclopédico é devastador. Vai pontuando os seus comentários com alguma nomina anatomica em francês, espanhol ou português.

Vai agora para Taipei durante cinco, seis dias, onde tem 6 prelecções. Irá prepará-las durante as 25 horas de voo, começando a primeira conferência de imediato... Provavelmente logo à saída do aeroporto. Sem descanso, sem hiato. Basta que lhe ponham um púlpito, como agora fazem os políticos nas suas conferências de imprensa, e providenciem um refill de coca-cola light.

segunda-feira, março 19, 2007

Prémio Falta Pouco para as Nações Unidas

Almocei com uma iraniana a viver na Bélgica, uma egípcia e um argentino judeu, a residir em Israel.

Só faltou a tradução simultânea, o sapato em cima da mesa e os motoristas à porta.

Prémio É o Próprio

Cheguei à Radiologia por volta das 7h20. Estava ainda vazia. Nem vislumbre da secretária. Um mal vestido, magricelas, aparece 10 minutos depois. Calça preta algo puída, de ganga, apesar da gravata, que lhe “caem pelo rabo abaixo”, de alguém que emagreceu recentemente (ou que as comprou faz tempo...). Sapatinhos pretos vulgo sneakers. Limita-se a disparar follow-me, quando pergunto pelo professor Schweitzer. É o próprio. E toca a segui-lo por lanços de uma escadaria interior ranhosa. Foram 6 pisos de passinhos pequenos, ou melhor saltinhos frenéticos.

Que bela maneira de começar o dia. A “sprintar” edifício abaixo, com mochila debaixo dum braço e casacos no outro, ainda a ressacar da falta de sono e café. Depois de 40-50 minutos a pé ou de metro.

Prémio O Hospital Não é um Cabeleireiro

Aviso no elevador:

Lembramos o staff que a informação clínica dos pacientes não deve ser discutida em público.
Mas se não discutimos no corredor, no café, no elevador, à entrada ou saída da urgência, na sala de ecografia com o doente deitado, vamos discutir onde? Em reuniões entre as diferentes especialidades? Em consultas de grupo? Em conferências interdisciplinares? Lá se vai a piada de trabalhar no hospital!!!

domingo, março 18, 2007

Este domingo não teve grande história. Foi acordar tarde. Marcar um encontro para ver um apartamento. Esperar mais de uma hora por um agente imobiliário que não se dignou a aparecer. Partir em seguida para outra zona da cidade, onde tentei desforrar-me com uma caipirosca e uma quesadilla num café mexicano, com pinta, Café Frida. Também por isso, achámos, finalmente, um duplex engraçadíssimo. Mas tão ou mais caro que todos os outros.

Depois foi caminhar lentamente pelo Central Park, já só, entre os raios de sol e a neve, com o frio a massajar a face e um ruído que adoro, que não é mais do que ouvir os próprios passos pela neve... Seguiu-se a loja da Apple, o "Skypar" com os pais, preparar uma aula transcontinental, avançar umas páginas do último Paul Auster e recolher cedo, que amanhã o dia começa às 6h.

"A Radiologia que trabalha e sua a bata, saúda a Radiologia que viaja e que debita cosmopolitismo em belas prosas..."

O Dr JG tem toda a razão. Há muitas radiologias. E radiologistas. Há os que suam a bata. Os que viajam. Os que nem bata usam. Os que usam bata e viajam. Os que usando bata não trabalham. Os que não trabalham nem viajam. Os que trabalham e viajam. E finalmente os que viajam, levando a bata!!!

sábado, março 17, 2007


Maldito frio. Maldita neve. Malditos pés encharcados. Malditas sapatilhas Puma. Malditas charcos de água. Malditos cruzamentos. Malditos semáforos. Maldita Timberland que desapareceu do mapa. Malditas meias ensopadas. Malditos pés transidos de frio. Malditas caminhadas. Maldito St Patrick's Day. Malditos cortes de estrada. Maldito Tello. Maldito Porto. Valha-nos o cartão de crédito. E umas botas de montanha novas, impermeáveis, para sobreviver no Novo Mundo.

O Saint Patrick's Day confirmou aquilo que já temia.

Os irlandeses podem ter os pubs. A Guinness. A música celta. As uillean pipes. Os Chieftains. A cidra. O whisky. Os Joyce e os Beckett. O cabelo ruivo. Sardas. Um grande crescimento económico. Os U2. Uma lei do aborto estúpida. Excelentes parque naturais. Killerney. Cork. Um espaço rural à moda antiga.

Mas o que adianta isso tudo se, no final, espremendo tudo, concluimos que não há mulher mais feia que a irlandesa?




Prémio Faz-se O Que Se Pode. Ou o Que Se Sabe

Diz quem foi acompanhando, que fui evoluindo, em termos da esritA ao longo do velho Alien em São Francisco. É possível. Tudo se treina. Depois destes meses todos sem escrever, lendo apenas livros técnicos, de imagens a preto e branco, de lutar contra a falta de vontade e distracção, peço antecipadamente desculpa. Pelo destreino. Pelas frases longas, frases feitas, banalidades e pelo texto (ou as ideias?) algo confuso.

Prémio Manifesto do Que Me Espera

Comparando com o ano passado, as regras são agora completamente diferentes. Não tenho medo dos serviços de imigração. Da cidade. Das pessoas que me vão receber. Do apartamento ou do senhorio. Não vou ter os dias de quarentena que tive em São Francisco em que passei os primeiros dias e fins de semana sem falar com ninguém. Vingava-me na net ou no blog. Durante dias as minhas únicas conversas ficavam-se pelos pedidos de café ou bagels. Apesar de já na altura ser um emigrante de luxo, foram uns primeiros tempos dolorosos. Que assustaram quanto à dificuldade de enganar o tempo. De fintar a solidão. Agora espero algo completamente diferente.

Vou ter a companhia da Joana. Levo-lhe um carregamento de um quilo de chocolates. Encomenda dos pais. Ficará aquém das saudades destes, mas penso que permite já ter uma noção aproximada da falta que faz na Avenida dos Caçadores e lá para os lados da Asperela.

Vou ser recebido por um workaholic. Por um judeu fanático, com sapatinho com favela de brilhantes, pronúncia estranha e fanhoso. Com centenas de artigos publicados. Um homem que queria que me fosse encontrar com ele no próprio dia da viagem, isto é, depois de um voo intercontinental, do departamento de imigração, dos controlos alfandegários, da fila de espera de uma hora por um táxi, que teve que ser partilhado, nojento, com restos de pickle nos assentos, em que as malas iam presas na bagageira por uma corda foleira, sob a inclemência de um nevão, entre duas horas de “pára arranca”.


Cuidem bem do Sr Feliciano e da Maria. Qual é o neto que se pode gabar de ter um avô que lhe prepara o pequeno-almoço, que é responsável pelas cadelas rafeiras e que muitas vezes lhe cozinhou um peixe cozido, um bife a cavalo com deliciosas batatas fritas? Quanto à Maria, quase não é preciso escrever....

Vou viver durante uns tempos em Nova Iorque. A Nova Iorque a preto e branco de Manhattan do Woody Allen. A da 25a hora de Spike Lee. Dos Padrinhos e Godfellas. Da Rosa Púrpura do Cairo. É a minha terceira vez. Mas a primeira em que assento poeira por estes lados. Tenho a sorte de já ter vivido por temporadas generosas em locais fantásticos. Foram 3 meses em Sidney, meio ano em São Francisco e agora Nova Iorque. Tive sorte de conseguir conciliar os estudos, a formação, com o vício, a paixão, a necessidade de viajar... Coitados dos que ficam, que depois têm de aguentar com as estórias, os apontamentos, as graçolas ou recordações, repetidos até a exaustão!

Prémio Reader Digest

Escrevo durante o voo. Viajo pela primeira vez na TAP. Muitos portugueses portanto. E muitos espanhóis adolescentes, em provável visita de estudo. Não há cá motoqueiros mal-cheirosos. O português do lado não rosnou sequer qualquer bom dia ao meu olá. É um homem novo, baixo, compacto, com barbicha à mosqueteiro, cabelo alinhado para trás, com gel, um daqueles inenarráveis fatos escuros, com riscas finas brancas, gravata também ela às riscas, com amarelos, castanhos, padrões laranja, riscos azuis, sapato preto de biqueira achatada, com um volumoso livro das Selecções. A tudo acrescia a característica mais portuguesa, mais universal, que faz do português um espécime inconfundível em todos os recantos terrestres. Se houvesse um concurso não sobre o Grande Português, mas antes sobre A Grande Característica dos Portugueses, que os distingue de todas as outras tribos ou povos, esta viria em primeiro lugar. Destacadíssima.

Mais que o desenrasca, a desorganização, alguma matreirice, o deixar andar, a capacidade de planeamento e de visão à merceeiro, o que se destaca no arquétipo do português típico, como este que se senta ao meu lado, é mesmo a hipertrofia da unha do dedo mindinho... Sem mais. Onde ela existir, independentemente do fuso horário, da região do globo, do clima, da latitude ou longitude, da altitude, seja deserto, estepe, floresta tropical, oceano de gelo ou alta montanha, seja um moquifo, um hotel imberbe no Nordeste Brasileiro, uma loja de massagens tailandesas, uma tinturaria mal cheirosa de Marrakesh, as praias de Goa, os glaciares da Patagónia ou apenas num café de pescadores perdido no Atlântico com vista sobre o Pico, estará lá um português.

O bigode continua a fazer sucesso entre a emigrantada portuguesa. Generoso e farfalhudo, despudorado. A emoldurar um sorriso mais ou menos desdentado. A acentuar o rosto cansado, moreno, queimado, geralmente suado. A barba está também rala, por desfazer. O cabelo não anda lá muito lavado.Temos então o retrato minimalista e injusto do português emigrante. É o emigrante humilde. Trabalhador. Muitas vezes injustiçado. Perdidos entre duas realidades. Imagino o ser-se imigrante como aquelas cicatrizes ou tatuagens que não têm volta. São estrangeiros sempre. Desadaptados. São emigrantes no seu país e naqueles onde vivem. Tornam-se estrangeiros de duas pátrias. Comparando muitas vezes as duas e vendo apenas os defeitos de ambas. Honra seja feita aos nossos emigrantes. E aos imigrantes também. Independente dos defeitos, da necessidade natural de afirmação, do gosto dúbio pela cultura mais pimba do país, são alvo da minha profunda admiração. Nenhum de nós imagina pelo que passaram. Ou passam. Como querem voltar às raízes, e se encontram presos pelos filhos. Como onde quer que optem por ficar, sentem que perdem sempre quase tudo.
Só por eles é que quero que o Benfica perca por poucos, quando joga fora da protecção da FPF.

Mas não se julgue que o avião acaba nos emigrantes. Não. Em todos os aeroportos, sempre que regresso a Portugal, identifico também, desde logo, os betos, os queques, os snob. Mas, na sua maioria, os portugueses benzocas que viajam são sempre mais excêntricos que os que tomam chã ou lêem o Expresso sob a vigilância das tias da Foz ou Cascais. Têm que ter sempre uns óculos de sol super cool, uns sapatos radicais às cores, uma camisola ou camisa arrojada, um casaco caríssimo super fashion. Por que temos que exportar broncos ou excêntricos gayzolas? Onde estão os portugueses neutros, com o seu desenrasca e criatividade, mas sem terem que ser necessariamente uma caricatura?

sábado, março 03, 2007

0 alien está de regresso. Já hoje. Ou dentro de dias. Talvez sábado ou domingo.

Não sei se será um um pouco mais do mesmo. Ainda estou para saber que tipo de registo surgirá. Não posso dizer que adoptarei este ou aquele estilo. Se confessional, realista, cronista, humorista. Não sei. Sou mais daqueles em que é o estilo que me adopta a mim. Afinal de contas é a história que faz o homem ou o homem que faz a história?

Estarei em trânsito. Noutra cidade. Numa grande cidade. No centro do mundo. Deixando os quarteirões familiares de São Francisco, o estilo relaxado da Califórnia, o activismo empenhado da "esquerda" progressista de alguém ainda nos sixties. Uma sociedade de causas, new age, ao mesmo tempo cristalizada e marcada pelo seu passado, mas génese permanente de novas ideias e conceitos revolucionários. Em São Francisco senti-me em casa. Numa aldeia grande, "slow pace", segura, bonita, com cromos suficientes para preencher uma caderneta de gente estranha, Mas em casa...

Em Nova Iorque não sei como será. É uma cidade, é um mundo, com outra dimensão. Não necessariamente mais europeia, apesar das distâncias serem mais curtas. Será, seguramente, uma cidade mais dura, agressiva e pulsátil. Mais gente. Mais trânsito. Mais arranha-céus. Mais turistas. Mais museus. Mais galerias. Mais turistas japoneses. Mais livrarias. Mais turistas de câmara em punho. Mais judeus. Mais judeus ortodoxos. Mais inqualificáveis mamarrachos Trump. Mais frio. Mais metro. Mais Soho. Mais esquilos. Mais Central Park. Mais Pretzels. Mais compras. Mais saldos. Mais ruído. Mais trabalho. Mais Harlem. Mais Bronx. Mais avenidas. Mais avenidas intermináveis. Mais funcionários da ONU. Mais táxis. Mais semáforos.

Agora que as malas estão quase fechadas, surge sempre a nostalgia. Daquilo que temos por certo. Por seguro. Nestes tempos de Valbom, de Porto, com a companhia imposta dos volumosos livros de texto por força do exame para terminar a especialidade, não tive tempo para lembrar-me de São Francisco. É engraçado ou irónico, que é agora que parto para outra viagem, que vou conhecer outro quotidiano, outras gentes, outras realidades, outra paleta de cores e ruídos, é agora então, como dizia, que sinto saudades de São Francisco, das suas gentes e forma de estar, de me sentir em casa, de ter conhecido e feito amigos, de me ter conhecido.