sexta-feira, setembro 29, 2006


Hoje é dia de despedida no hospital. Com vinho do Porto e queijo da serra. Com ou sem negligência médica. Deixei a garrafa a arejar, um LBV de 98 e um dos fellows conseguiu entornar um pouco na alcatifa. Imaginem todas as outras especialidades a passarem por lá a tirar dúvidas e sentirem o cheiro a álcool.
Hoje à noite vem Las Vegas. Amanhã Grand Canyon. E depois sou eu e o Ry Cooder.

quinta-feira, setembro 28, 2006


Vou estar cinco dias no Faroeste Americano. By myself. Fica prometido então um balanço do que foi este blog, de como foi mudando com o tempo, no conteúdo e na forma, o que aprendi e perspectivas futuras. Aguardem. Os dias no deserto vão servir também para me colocar à prova. Em viagem. Pelo silêncio. Pelo tempo. Pela luz. Pelo espaço. Por paisagens que espero esmagadoras. Fiquem bem. Estou quase de partida. Ou melhor, de regresso. Ou melhor ainda, as duas coisas.

quarta-feira, setembro 27, 2006

1. O FCP perdeu. Sem apelo e sem agravo. E o que mais custou foi ver a diferença de andamento mas, sobretudo, a falta de garra ou atitude. Pareciam, à partida, conformados com o que quer que acontecesse. Onze burgueses dentro do campo. Nem o facto dos adversários equiparem de vermelho...

2. Foram-me outra vez ao bolso. Ou à carteira. Isto é, fui roubado. Os imbecis atacaram outra vez. E levaram o assento da bicicleta!!! Que raio de fixação. Logo agora que tenho 3 dias para me desfazer dela. Primeiro roubaram o assento de uma. Depois foi a bicicleta inteira. Depois foi o pateta que teve aquela paragem cerebral de generosidade pelo mafioso do italiano e ficou com a bicicleta mais antiga de toda a baía, para não dizer da costa oeste. Seguiu-se a bicicleta nova. O que estará mais por acontecer?

3. O metro em que seguia teve um acidente. Abalroou uma daquelas pickups que se meteu pelos olhos dentro.

4. Perdi os adaptadores que transformam os óculos em óculos de sol.

5. A saca da máquina fotográfica devia estar dentro do saco do computador. Aquele que desapareceu. Que deu o sumiço. Por feitiço. Por maldição.

6. Talvez por tudo, talvez por nada, passei o dia com um humor desgraçado. São Francisco já era há muito tempo. O blog suspira pela falta de atenção. Está já em agonia, nos seus estertores finais. Não sei para onde virar-me. Tenho hotéis por marcar e carro por alugar. Aproxima-se uma road trip. Gostava de fazer compras. Preciso de acabar um dos trabalhos no qual não acredito muito. Falta fazer a faxina. Fazer que limpo o que há para limpar.

7. As duas boas notícias do dia. A UCSF está nos dois finalistas, juntamente com a clínica Mayo, para melhor programa de formação de residentes, vulgo internato complementar, dos EUA. Já tenho uma das cartas de recomendação que pedi. Descritiva e generosa quanto baste... Quem a ler não acredita que fala do mesmo idiota da saga das bicicletas roubadas e dos sacos desaparecidos. Mas não podíamos ao menos ter marcado um golito?

terça-feira, setembro 26, 2006

Eduardo Prado Coelho - Público

Às vezes, ao chegarmos a determinado ponto da geografia de que estamos próximos sentimos que aquelas ruas, aquela disposição das casas, aquela areia da praia, aquela tonalidade da água do mar, nos pertencem desde sempre, e que ali poderíamos ter uma moradia ou mesmo tentar viver num corte abrupto com a existência urbana.

domingo, setembro 24, 2006

Este foi último fim de semana em São Francisco. Já comecei a fazer as malas. Lamento a falta de tempo. E começo já a sentir saudades. Nunca personalizei muito, porque acho que não tenho o direito de falar das outras pessoas. A exposição do blog é minha e sou que tenho que a assumir. Gosto de deixar os outros em paz.

Julgo que fiz verdadeiros amigos por cá. Amigos que admiro pela sua bondade, por me terem sabido acolher e pela generosidade de me fazerem amigos dos seus amigos. Souberem mostrar-me um outro lado da cidade, os pequenos recantos, os restaurantes menos conhecidos, os cafés e cinemas preferidos. Souberam dar e receber. Acolheram de braços abertos os meus pais e o meu irmão. Jantámos inúmeras vezes. Tivemos muitas conversas. São amigos de São Francisco, por que inevitavelmente conheci-os cá. Mas independentemente das circunstâncias, seriam também amigos no Porto. Como diz o António, "são gente boa".

Sábado começou com um brunch, algo tipicamente americano, numa lanchonete das redondezas de dois coreanos simpatiquíssimos e os inevitáveis mexicanos. Nunca teria reparado naquele corredor feito restaurante se não fosse o Alexandre. Mas aprendi a gostar daquele lugar, daquela gente, da sua simplicidade. Depois seguiu-se um café, ou melhor dois cafés, no mesmo local onde perdi e recuperei o computador. O dono é um iraniano, dos seus cinquentas e tais, ar negligée, barba por fazer e cachimbo na boca. Tudo isto ao lado da Rita e do Alexandre. A tarde foi reservada para algum trabalho de despedida (uma banda sonora que tenho tentado fazer mas sem qualquer programa de mistura) e para preparação das malas e selecção do que é para ficar ou levar.

À noite houve aniversário. Brinde e jantar. Num restaurante indiano. Seguiu-se depois uma viagem até Twin Peaks, a zona mais alta de São Francisco. By night. Fomos de propósito. Por minha causa. Por insistência do Alexandre e do Cedric. Só posso agradecer. Mas penso que o melhor agradecimento foi mesmo a paisagem. Os milhares de luzes, os recortes, as sombras, os vultos ou perfis de sítios que aprendi a conhecer e a gostar neste último meio ano. Metade da cidade expunha-se, exibia-se, vaidosa, mas sempre naquele jeito sereno, calmo, tranquilo de São Francisco. Os cruzamentos perfeitos, o arvoredo das vizinhanças, um ou outro carro, este, aquele e aqueloutro montes, as colinas, as fachadas. A baía ao fundo, fechada na sua negritude, apenas violada pela pirotecnia da Bay Bridge e um pequeno farol em Alcatraz. A outra metade da cidade escondia-se. Por baixo de um nevoeiro cerrado, denso, espesso, com personalidade. Um nevoeiro que se transformava amarelo pelas iluminações que não deixava transparecer. Até que em minutos, primeiro através de uma luz, depois outra, depois uma ameia, uma torre, começava a antever-se a Igreja de Santo Inácio, da Universidade de São Francisco. Sem razão aparente, o manto amarelado, começou a dissolver-se, a recuar, fugindo daquele lugar. Começavam agora a ver-se o topo das árvores e todo aquele jogo de sombras, de texturas, quase ainda sem formas. Não ficaram fotografias ou diapositivos. Também não acredito que fizessem jus à beleza do momento. No topo de São Francisco, em silêncio, com o vento mais generoso e complacente que o habitual, entre amigos que não sei quantas vezes mais voltarei a ver...

Domingo...

sexta-feira, setembro 22, 2006

Os últimos dias foram em permanente jet lag. Trabalhei em S. Francisco mas deitei-me às horas australianas! Dormir duas-três horas por dia resultou que me arrastasse qual Zombie pelo Museu de Arte Moderna. Era uma das visitas obrigatórias aqui no burgo. Deixei para os últimos dias, nestes tempos de saldos e de fazer tudo em câmara rápida. Cheguei inclusivamente a adormecer ao ver uma instalação de vídeo. E deixei num dos cantos do sofá, umas compras que tinha feito nessa tarde. Vá lá que estamos em São Francisco, e meia hora depois estavam no mesmo síto. Vou desligar. E colocar-me em stand-by. Já só penso na luzinha vermelha desde que acordei!

quarta-feira, setembro 20, 2006

Quem diria que um anticiclone centrado nas zonas mais austrais de África, poderia condicionar um movimento tão animado nos comentários ao blog? É caso para dizer que é musa inspiradora por defeito...

terça-feira, setembro 19, 2006


Quem vai gostar do novo brinquedo, quem vai?

Cantina do hospital. Jantar de trabalho, no meio de RM e tentativas de fazer imagens de subtracção. O jantar foi comida indiana. Um curry qualquer. Com batata e arroz. Foi a primeira vez que servi o arroz com aquelas colheres de tirar bolas de gelado. Imaginem só. Nem preciso dizer mais nada quanto à qualidade ou consistência do dito!

segunda-feira, setembro 18, 2006

Uma bicicleta à São Francisco. Só pode!

Crissy Fields


Alamo Square e o Civic Center ao longe...

O carácter familiar de um pequeno café, perdido numa esquina da vizinhança

Um Carocha à São Francisco. Só pode!

domingo, setembro 17, 2006

Começo a fazer a listagem dos sítios a visitar em São Francisco. É sempre assim, vão ficar imensas coisas por ver, por fazer. Já olho para os sítios com os olhos de quem se está a despedir...

Ontem estive duas-três horas, pela madrugada dentro, a preparar os 8 dias de férias que vou tirar quando terminar o estágio. A 29 de Setembro. Vou fazer uma road trip. Pelos desertos da Califórnia, Arizona e Utah. Pelo Grand e Bryce Canyon, pelo Death Valley e Joshua Tree National Park e pelo Zion NP. Ainda se aceitam inscrições. A primeira etapa é San Francisco-Las Vegas. By plane. Dia 29 de Setembro. Pela tardinha.

Este domingo esteve um dia espectacular, sobretudo se usarmos os critérios de Frisco. Sol e sem ponta de nevoeiro. Pouco vento, apenas. Toda a gente nas ruas, nos jardins, nas praias, na marginal a passear por Crissy Fields.

Tive que recusar um convite para ir para a praia. Decidi antes passear de bicicleta e estudar.
Voltei ao Grove Café, que tive oportunidade de apresentar aos meus pais e irmão. Depois foi estudar um pouco. Supostamente deveria ter terminado uma apresentação de RSNA, mas a escolha das imagens tem sido penosa... E não tinha o disco externo de 160GB com as imagens DICOM. Por falar nisso, a dra BV já arranjou os casos que lhe pedi?

Quem diria que a melhor maneira para se estudar é apreciar uma Chimay ou uma Leffe?

Não se aprende mais (espero que não se aprenda muito menos), mas vá lá que custa menos a passar o tempo. E não contamos tantas vezes as páginas que faltam para terminar o assunto ou capítulo em questão...

Cheers. Será que o mesmo princípio se aplica para relatar TC ou RM? E como melhoraria o contacto com as outras especialidades? Acho que deveríamos fazer um estudo piloto no São João, duplamente cego... E avaliar se existiriam diferenças entre a ingestão matinal ou vespertina. Com estômago vazio ou após um lauto repasto. De golada ou à palhinha. À temperatura ambiente ou própria. De segunda ou terceira fermentação.

Procuro candidatos. Podem inscrever-se. Tentaremos arranjar um patrocínio e andaremos com umas camisolas e umas daquelas vestes típicas da Oktoberfest de Munique.

sábado, setembro 16, 2006

Coitado do Labreca...

sexta-feira, setembro 15, 2006

Médias de entrada mais altas

183,0 Medicina na Universidade do Minho
181,5 Medicina no Inst. Ciências Biomédicas Abel Salazar
181,0 Medicina na Fac. Medicina na Universidade do Porto

Muito boa gente deverá ter entrado em estado de choque. Ou caiu da cátedra. Pode ser que seja ainda melhor que um Choque Tecnológico.

Depois de 6 meses por estas bandas, ainda vai ser mais difícil lidar com as pequenas e grandes vaidades, os feudos, o imobilismo, o jogo de bastidores e a burocracia que emperra o funcionamento de quase todos os serviços públicos portugueses.

Apesar de me encontrar fechado nas salas de leitura de exames dos diferentes secções de abdominal ou tórax, consegui ter uma noção do avanço tecnológico e da agressividade diagnóstica e terapêutica que eles colocam em cada doente. A quantidade de transplantes pulmonares, hepáticos, renais ou pancreáticos, o número de PET-CT diário, os follow-up de lesões pulmonares em intervalos de 3 meses, o uso de ablação por radiofrequência, de filtros da veia cava, stents biliares ou pancreáticos, o rastreio agressivo dos doentes com cirrose ou hepatites víricas, derivações digestivas várias, próteses penianas para manutenção da potência, procedimentos de quimioembolização arterial, estudos pré-transplante em dador vivo, o elevado número de doenças intersticiais pulmonares com diagnóstico estabelecido e a velocidade com que se parte para a broncoscopia e biopsia, comprovam-no.

Com isto quero dizer que não é propriamente a Radiologia, até por que os diagnósticos são iguais em todo o lado, mas a medicina em geral que está noutro patamar. Os fundos parecem ilimitados e o investimento em cada doente, por muito doente que esteja, é impressionante. O trabalho em equipa, a comunicação entre as diferentes especialidades funciona claramente melhor (se se pretende contactar o médico Y do doente X em Portugal, perde-se 10 minutos para ser atendido para a telefonista, 5 minutos para atenderem na Medicina A, afinal o doutor está hoje na Medicina B, depois está na consulta mas deslocou-se à Urgência, vão tentar saber o número do telemóvel, está desligado, não atende, não é dia de estar no hospital. Perde-se literalmente meia hora, fica-se mal disposto pois não se adiantou nada e entretanto temos já 2 ou 3 TCs atrasadas).

Necessariamente esta dinâmica traduz-se depois na Radiologia. A obrigação de qualidade, de precisão, a exigência de responder ao pormenor implica necessariamente com melhor capacidade de resposta. E o facto de serem muitos mais e todos eles especializados numa área restrita, trabalhando exclusivamente no sistema hospitalar, com ensino e investigação nas respectivas áreas (sim, a investigação e a publicação científica não é só estimulada como quase obrigatória. É uma garantia de qualidade e publicidade ao serviço mas também, e talvez mais importante, de garantir fundos ao departamento com a concessão de subsídios e grants) faz a diferença. Até por que não acho que haja muita diferença entre os internos ou residentes. Eles estão mais habituados a falar em público, a discutir os doentes numa plateia, a enumerar os diagnósticos diferenciais plausíveis e os mais inverosímeis, e claro estão mais atentos ao detalhe e pormenor. Mas estão também menos habituados a pensar por eles próprios, tentando driblar as suas dificuldades, dado que, na grande maioria das vezes, têm sempre a bengala ao lado.

Depois disto, repito “Depois de 6 meses por estas bandas, ainda vai ser mais difícil lidar com as pequenas e grandes vaidades, os feudos, o imobilismo, o jogo de bastidores e a burocracia que emperra o funcionamento de quase todos os serviços públicos portugueses.”. Em muitas medidas, os hospitais portugueses parecem parados no tempo. É inadmissível fazerem-se várias bandas gástricas por semana e não se realizarem PET nos seguimentos dos linfomas ou não haver transplantes hepáticos. Só existe uma explicação, mas essa fica para vocês...

E apesar de diariamente contactar com líderes destacados nas respectivas áreas de interesse, só por uma vez senti aquele estatuto, aquele falar, aquele levantar de cabeça característico da professorite. Procurei o nome do ancião indiano com esse porte, cardiologista de profissão. Uma pesquisa rápida na Pubmed revelou que tinha mais de 400 artigos publicados. Tudo em revistas de top. Muitos de revisão para os quais é certamente convidado. Perante isso, tive que me render. Este pode...

Prémio Ser Médico no Século XXI

Tom Waits :
I practice at home, on the kids. Interestingly enough, there are a lot of musicians who are 
also doctors, or a lot of doctors who are also musicians. There is a connection. Surgeons work in 
a theatre, and they call it a theatre. All medical procedures require two hands, so in a sense it's 
like when you play an instrument. That's what they call things that they use in their work: They 
call them instruments. I've played with a lot of musicians who are also doctors. I worked with a 
bass player who was a doctor. You know, I suppose there is a connection. A lot of people start 
out majoring in medicine and drop it and change their major to music. I don't know, it's just one of 
those things. "



Cada vez mais o médico é menos artista. Refém das referências enciclopédicas, da informação em tempo real da Internet e dos novos estudos, protocolos de diagnóstico ou guidelines terapêuticos. Faz parte do estado da arte estar actualizado e falar a mesma linguagem dos artigos, das revisões e, claro, dos colegas da mesma ou diferentes especialidades. Isso obriga a um esforço que se quer sério de actualização e aprendizagem A informação está em toda a parte. Nos calhamaços dos tratados. Em livros de bolso. Em palmtops. Na internet.
O carácter do raciocínio, de “imaginação” ou da própria “ arte” que poderia estar inerente à medicina em tempos idos tem-se desvanecido e transformado num componente maioritariamente técnico e mecanizado. Muitas vezes melhor para a generalidade da praxis médica, mas pior para o médico que perde o carácter inventivo, imaginativo e libertador da profissão.

No entanto, por muita informação, muito protocolo, muita orientação, muito livro, há sempre quem faça mais com a informação que tem. Muitas vezes é um estado de atitude crítica perante as informações que chegam, cruzadas e desviantes. É um manter da pulga atrás da orelha. É um pouco de imaginação, não sei. É esta postura que permite que se consiga desmontar diagnósticos, repartir e baralhar de novo os diferentes achados por forma a ajudar a orientar verdadeiramente os doentes. Muitas vezes, poderá ser o que faz a diferença em 5 por cento dos doentes ou das doenças.

Acontece que esta necessidade de apego às regras e ao estado da arte, leva a que a actividade médica se torne menos estimulante. E quando se pergunta aos médicos em geral que mais gostariam de ser, a grande maioria que eu conheço gostaria de algo criativo. Talvez porque a medicina é cada vez isso mesmo. Tira a liberdade pessoal de raciocinar. Obriga a pensar em termos de probabilidades, de riscos, formas de se ser rigoroso e eficaz. Muitas vezes faz falta a liberdade de criar. De desmontar paradigmas. De fazer algo por nós próprios. Talvez por isso haja tantos médicos artistas, escritores, pintores. Torna-se mais fácil sê-lo, também. O contacto com muita gente. Muitas conversas. Impressões. Confissões. Relatos. Sofrimento. Pequenas vitórias. Grandes vitórias. Fé ou desespero. Estados de dependência e entrega absoluta. Tudo isto pode constituir um arsenal extraordinário de experiências extraordinárias. Depois, bastam os 5 % de inspiração, dado que o resto da transpiração está já lá.

quinta-feira, setembro 14, 2006


Umas das cenas mais bonitas, melhor realizadas, mais marcantes da história do cinema. Para mim, claro. Pelo diálogo. Pelo monólogo. Pela luz. Pelas sombras. Pelos reflexos. Pelos diferentes ângulos. Pela interpretação. Pela música. Pela história. Pelo resto do filme.





Irra, que passo mais frio por estas bandas do que passei na Patagónia. E o vento patagónico foi uma doçura quando comparado com este do Sunset.

quarta-feira, setembro 13, 2006




Semana passada fomos a um restaurante com comida portuguesa. Nome impronunciável mas cozinheira portuguesa. Serviu para "matar o borrego" com um excelente caldo verde e com uma Super Bock fresquinha. O Bacalhau à Gomes de Sá estava já muito estrangeirado, algo salgado e com uma forma diferente de cozinhar as batatas... Também toquei mesmo ao de leve. Cedi o meu prato a uma italiana que suspirava pelo famoso codfish português e apanhei um táxi para o hospital. Mulheres! E desmaios! Uma amiga francesa tinha tido uma indisposição qualquer, provavelmente catalogável no DSM-IV, depois de um fim de semana de borga no deserto, no meio de 40 mil hippies... Estive pois a fazer figura de corpo presente, tentando animar as hostes pois, como médico mesmo, não me era permitido fazer mais nada. Mas fiquei com a sensação que não fui muito bem interpretado. A moça e uma outra amiga queriam dar uma seriedade à lipotímia e ao facto de estar com hipertensão quando chegou ao hospital. E eu a tentar desmistificar! Mas vá lá que a histeria americana ajudou à festa. Toca a fazer análises, ponderar as doenças mais improváveis, estadiar a hipertensão na urgência, assustar bastante, assustar muito. Fizeram de uma rapariga saudável uma outra doente. Que ainda hoje, uma semana depois, está em casa. A descansar. E, não bastava isso, dado que dois, três dias depois lhe apareceu uma dor de cabeça, toca a fazer uma punção lombar. Imagino poucas coisas mais ridículas e disparatadas. Depois vai ser o feocromocitoma, o síndrome de Conn, a fibrodisplasia muscular das artérias supra-renais, umas acidoses tubulares renais e por aí em diante. A pobre da moça não apareceu mais em público. Nem ela nem o recente namorado! Coincid|ências? Ou talvez não...

O desgraçado, que é um paz de alma, quando viu as agulhas também caiu redondo. Nem ai nem ui. Quando o vi, estava já numa maca, também ele monitorizado, com um soro que é para aprenderes, e oxigénio, talvez para refrescar as ideias-

terça-feira, setembro 12, 2006

Prémio Em Jeito de Rábula... Apressada


O meu desaparecimento tem vários culpados. Não conseguirei apontar o dedo a todos eles. Mas mãos à obra. O primeiro é o tempo. A falta de tempo. A desorganização de quem não consegue fazer do tempo, todo o tempo que quer. O segundo é o trabalho. E de quem não tem tempo para este nem para dormir. O terceiro, são os amigos, que transformam o tempo em algo mais generoso, mas que infelizmente não param os ponteiros do relógio, muito menos fazem o tempo voltar para trás. O quarto, bem o quarto é das séries mais extraordinárias que vi nos últimos anos. Comprei por atacado na Amazon, por menos de metade do preço. Culpemos então a Amazon. Ou a Internet. Ou os correios. Ou as promoções. Ou os realizadores, produtores e actores de Northern Exposure. Para quem tem que trabalhar e preparar-se para um exame, que tal dezenas de episódios passados na "Última Fronteira" americana? À atenção de quem gosta de boa televisão. O que é um paradoxo para quem desde que chegou não se sentou mais de meia hora à frente dessa mesma televisão (excepção feita ao campeonato do mundo). Pronto, vou deitar. É o post possível. Às quatro da manhã. Em cinco minutos deste tempo estúpido que não pára mesmo...

segunda-feira, setembro 11, 2006

domingo, setembro 10, 2006

A maldição do Expresso

Pedro Mexia - Blog "Estado Civil"

Já contei porque é que compro o Expresso: porque receio que descesse de classe social se não o comprasse.

Embirro vivamente com o semanário do Balsemão, e no entanto sou fiel aos meus rituais acéfalos de burguês lisboeta.

Hoje, o Expresso apareceu nas bancas remodelado. Consequência: esgotou. Não o encontrei em lado nenhum. Exceptuando as idas ao estrangeiro, é a primeira vez em anos e anos que não compro o Expresso.

E desde as quatro da tarde que me sinto empregado de balcão.

sábado, setembro 09, 2006

How it Ends

How it Ends - Devotchka


3243 fotografias, a 3 centésimos de segundo cada, dos últimos 5 meses. Não ficam fotografias por mostrar nem censuradas. Todas elas com o mesmo destaque. A passar a um ritmo furioso, caleidoscópico. Resumem muito do que há para resumir do que se tem passado. Já começo a preparar o regresso das caravelas. Foram muitos momentos bons, muito bons e alguns outros menos bons. Momentos de descoberta, fruição, por vezes de deslumbramento mesmo e outros de reflexão, introspecção e amizade. Momentos em que foi importante saber estar sozinho e conviver com nós mesmos e alturas em que saber dar-se e receber são essenciais para criar e fazer perdurar novas amizades.

São imagens, retratos, momentos que ficarão sempre e para sempre. Que fazem já parte de mim e que me tornam já diferente do que era quando cheguei. Sinto que esta experiência, esta forma de vida me fez crescer. Em todos os planos. Tornei-me necessariamente melhor médico, melhor "repórter", melhor amigo, melhor Rui, melhor Ruca ou melhor Acuna.

Estes 5 minutos e qualquer coisa tentam seguir isso mesmo. Acompanhar o crescimento, a maturação, o desenvolvimento da minha estadia em São Francisco. São imagens, pedaços de cor, de luz, formas, sombras, texturas que surgem vertiginosamente, que se insinuam de forma quase subliminar. Servem sobretudo para gozo pessoal. Mas julgo que aqueles que têm acompanhado este meu trajecto atabalhoado, por vezes pontuado por um ou outro escrito, uma confissão, um ou outro queixume, vão também apreciar. Espero que gostem.

Terça foi cinema no Castro. É umas das salas mais bonitas da cidade, como podem atestar facilmente as fotografias. Pela sua cor branca, debruado das paredes, o colorido dos seus néons. O interior é também ele muito bonito, trabalhado, pouco habitual na tradição espartana e pragmática que predomina nestes lados do Atlântico (ou Pacífico, melhor dizendo).

Fomos assistir a um dos primeiros filmes do Almodóvar. Enquandro no ciclo Viva o Pedro. Mulheres à Beira de Um Ataque de Nervos. Um filme muito longe da densidade dos últimos, em que, como poucos, Almodóvar consegue falar da pedofilia, o amor gay, a violação de alguém em coma, como algo denso, sem maniqueísmos do mundo a preto e branco, conseguindo encontrar-se algo de profundo, por vezes tragicamente belo, desconcertante em temas unanimamente difíceis e constrangedores!

Este outro filme não tem nada a ver com isso. É uma comédia. Despretensiosa. Leve. Ligeira. Tipo pastilha elástica. Que Sabe bem enquanto dura. Mas gostei muito. Foram 90 minutos de bom disposição, de risos, sorrisos ou mesmo gargalhadas, com temas banais, do dia a dia, por encontros e desencontros burlescos. Estava com saudades do amor latino. Dos nossos tiques, defeitos e idiossincrasias.

Na próxima semana já não me lembrarei do filme. Mas gostei.

sexta-feira, setembro 08, 2006

Conseguem imaginar alguém que sem estar sob o efeito de psicotrópicos, neurolépticos, ansiolíticos, barbitúricos, estimulantes, estupefacientes ou num estado eufórico, disfórico, amnésico, catatónico, estuporoso, comatoso, etilizado, sem particulares crises de pânico, ansiedade, claustrofobia, agorofobia... conseguem então imaginar alguém, supostamente normal, que consiga perder a mala do computador, sem fazer a mínima ideia onde a possa ter deixado e sobretudo como conseguiu perdê-la sem deixar rasto e mantendo o computador, o rato e o transformador intacto?

Eu diria que seria bruxedo, mal olhado, feitiço, forças ocultas, malévolas, benévolas, espíritos, espíritas, pais santo, candomblé, feiticeiros, bruxos... Diria tudo isso e talvez mais! Se não me conhecesse...

Vá lá que estava mesmo a precisar de comprar uma nova! Não sabia... Mas precisava. E antes ter o computador sem a mala do que o contrário.

quinta-feira, setembro 07, 2006

Cenas dos Próximos capítulos..

O que está por contar, ou uma forma de dizer cenas dos próximos capítulos...

1. Cinema no Castro. Mulheres à Beira de um Ataque de Nervos

2. Caldo verde, Superbock e Bacalhau à Gomes de Sá no outro lado do mundo.

3. Noite rocambolesca com 2 amigos no hospital, a primeira porque desmaiou, o segundo por ter visto agulhas

4. Dissertar sobre o comentário do JG a proprósito do Tom Waits se ter feito passar por médico e as semelhanças e diferenças entre a arte (Arte?) de uns e de outros

Fica prometido. Para as calendas gregas ou talvez mais cedo.

quarta-feira, setembro 06, 2006




terça-feira, setembro 05, 2006

Vantagens de se estar encerrado em casa


Descobrem-se verdadeiras relíquias. Daquelas óptimas para se ouvir nas tardes de Inverno, de borrasca, à lareira, apreciando o vento, o ceú carregado e, para os afortunados, o mar...

Prémio Não Lembrava Nem Ao Gato Fedorento...

Excerto de crónica de José Vitor Malheiros, Público, onde reproduz excertos de conversa com um taxista...

"Sabe o que é eu gostava?"
Não sabia, mas a resposta não foi inesperada: "O que eu gostava era de ganhar o Euromilhões!" Mas antes que tivesse tempo de responder que com um prémio do Euromilhões se pode de facto comprar um belo quiosque...
"Se eu ganhasse o Euromilhões, era ainda pior que o Bin Laden... Estes gajos todos haviam de ver... havia de rebentar com eles todos à bomba." A voz tinha subido de tom e o rubor de intensidade. "Era mais terrorista que a Al-Qaeda. Eles haviam de ver! O Bin Laden ainda é bom para eles."
A cólera não permitia águas na fervura do género: "De facto, isso é muito chato, mas o importante..." Deixei o gás sair até chegar ao destino, reagindo com um mínimo de monossílabos, mas o fervor radical não tinha diminuído mesmo depois da corrida paga.
"A sorte deles é que eu tenho contas para pagar e uma família para sustentar. O Bin Laden, esse pode, porque é rico! Mas eu tenho de andar aqui o dia todo agarrado à roda para ganhar o sustento. Mas se eu tivesse dinheiro... ai, se eu tivesse dinheiro, o terrorista que eu não havia de ser!" Não havia um fio de ironia na voz.
Que as circunstâncias fazem o terrorista já se sabe, mas era a primeira vez que me tinha cruzado com uma vocação tão fervorosa frustrada pela falta de dinheiro e com uma utilização tão original de um prémio do Euromilhões. Era a primeira vez que me cruzava com alguém que só não era terrorista porque não tinha dinheiro para isso.

segunda-feira, setembro 04, 2006



Autóctone. San Francisco. Since 1896.

Prémio Confiava Alguma Coisa a Este Homem?

Reverie Cafe. Introdução de dados. PSAs. Nadires. Biópsias. Gleason scores. Cintilogramas. PETs. RMs. TCs. Estes médicos fazem a vida difícil aos doentes. Mas sobretudos a quem quer investigar alguma  coisa.

São resmas de papéis. Muitos sem informação prestável. Outras sem informação interessante.
Invejo pelo canto do olho as pessoas gozam o feriado. Tenho dois "trabalhadores" ao lado também com o seu computador, inevitavelmente Apple, inevitavelmetente Powerbook. San Francisco é certamente o paraíso para os Mac Addicts desse mundo inteiro. Fica essa boa nova para o Dr Gonçalves.

Até que chegou um homem nos seus 50-60 anos. Seco de carnes. Cabelos lisos, finos, sem forma ou volume. Barba rala. Nariz adunco, vermelho. Trazia um cházito. E um saco de plástico, de higiene duvidosa, amarrado por um cordel e com um bolo daqueles compactos, sem grande história, provavelmente de cenoura ou feijão. Demorou vários minutos a sentar-se. E inspeccionava o assento. E volta a sentar-se. E dava um pulinho, e depois sentava-se. Levanta-se. Sentava-se ligeiramente ao lado. Novamente um pulinho. E volta ao local inicial. De cada vez que ele pulava, eu estremecia também. Depois limpou dezenas de vezes a mesa. As migalhas. Ora varria. Ora caçava uma por um com o indicador. E mais um pulinho. Mais uma migalha. Depois alisava o jornal. E voltava a alisar. Nova migalha. Depois polia a mesa. Olhava para a funcionário. E continuava a mascar o bocado de bolo que tinha trincado largos minutos antes....

Desisti, antes que ficasse também tolo.

domingo, setembro 03, 2006

The Dreams You Left Behind

The Dreams You Left Behind - Micah P Hinson

Fim de semana prolongado. Fim de semana de trabalho. À volta de apontamentos, registos de doentes e computador. Vi apenas hoje a cidade em miragem, com as luzes dos arranha-céus, perfilando-se na noite e nevoeiro, no caminho casa-hospital. Cinco minutos, apenas. Falta um mês e eu preso ao raio de um computador. A uma base de dados.

E para espairecer, o que fiz? Jantei em frente ao computador do hospital revendo mais de 30-40 exames de TC torácico de alta resolução. Como devem imaginar, já vomito bits e bytes e vejo o mundo em escala de cinzentos...

Pretendo amanhã resgatar a bicicleta, com apontamentos e o mesmo computador e devolver-me à cidade, nalgum café animado, com gente, com barulho, com boa música e se possível com vista da Golden Gate, de Alcazar, de Pacific Heights, do Fort Mason, do que quer que seja. Sentir que não estou a desperdiçar os tempos que faltam, os amigos que ficam. Vai ficar muita coisa para ver e fazer. Falta o Moma, o Presídio, o Exploratório, o Jardim Chinês, Berkeley. Faltam jantares. Saídas. Encontros. Despedidas.

PS. Falta paciência, imaginação ou vontade. Desculpem. Salvou-se o jantar ontem. Onde pude voltae a saborear ovos moles de Aveiro, imaginem. E figos frescos. E vinho português. E conversámos e conversámos. Entre amigos. E apreciámos um novo vídeo que irá surgir mais dia menos dia. Ainda do Kauai...

PS. Fica por relatar o Acontecimento do dia de ontem. Espero por voluntários... Fiz a minha parte com o post anterior. Foi dos que me deu mais trabalho mas foi daqueles que me deu mais prazer. E sinto que não fiz favor nenhum. Agora é a vossa vez (excluíndo os noivos). Não aceito desculpas...

sábado, setembro 02, 2006

Felicidades



Tentei um discurso. Mas não consegui escapar das palavras da circunstância ou dos lugares comuns. Também não há muito para inventar. Para uma ocasião solene e séria, querem-se palavras sérias e sinceras.

Deixo-vos apenas o desejo de felicidades. E que estejam à altura um do outro.

PS1. A prenda vai depois, no regresso do gringo, para vos dar na primeira vez que me convidarem para jantar em vossa casa!!!

PS2. Coloquei este post antes do tempo, mas com a hora e a data "oficiais" certas... Para permitir que os noivos vejam, antes do nervoso da ocasião...