terça-feira, junho 19, 2007

Sim, o blog tem sido relegado para segundo plano. Eu próprio tenho sido relegado para segundo plano. As noites são cada vez mais curtas e os dias compridos. Estes nova-iorquinos são loucos. Trabalham como tolos. Fazem reuniões aos sábados, esturricam sob o sol inclemente do Central Park e não precisam nunca de descansar. Tenho uma série de pequenas coisas para contar, mas também não me posso cansar muito. Tenho que me guardar. Aproveitar a inspiração do momento e mantê-la em banho-maria, em lume brando. Sábado, 23 de Junho, está mesmo à porta. Posso dizer que falta pouco. O que é sempre verdade para quem está preparado há tanto tempo. É um dia importante. E tenho que escrever algo à altura. Hoje quando voltava de metro para casa começou a insinuar-se o que dizer. Provavelmente sairá algo muito diferente.

Seguem-se pequenos apontamentos. Ou trivialidades. Ou como um português ocupa o tempo livre numa cidade que não pára. E desgraçado de quem olha para trás.

Quarta foi noite de ópera. No “great lawn” do Central Park. Na relva, sobre duas ou três mantas, fomos petiscando e conversando ao som da música. Soube bem, apesar de algum frio. Foi um piquenique enquadrado pelas estrelas, pelo canto lírico, com um bom vinho português (obrigado Madureira) e sobretudo boa companhia.

Sexta deu lugar a jantar de “fellows”, apadrinhado pelo Jenanan Vairavamurthy (!), estudante de Medicina do Sri Lanka. Num restaurante indiano. Do sul do sub-continente. Consegui sobreviver ao curry, ao picante, à água, à água em copo de metal, à indicação que “a pia era só para lavar as mãos”, aos olhares enojados de gente menos feliz, desgraçada, que tentou enganar a fome com um pouco de arroz e algo entre o crepe e a hóstia. Deu para tentar aprender a comer com as mãos, ou melhor, com a mão direita. O uso da esquerda é tido por grosseiro em todo o sudoeste asiático. Fiz de quatro dedos uma colher enquanto o polegar, que resta disponível, empurra a comida para a boca. Tentei ser romano em Nova Iorque e por isso, durante dois dias tive que lidar com o cheiro a curry na mão. Seja. Mais tarde seguimos em conversa animada por um daqueles bares que só encontramos por estas bandas, com sofás, candeeiros, abajours, como que partilhando a comodidade da casa de alguém entre amigos e desconhecidos.

Sem tempo para descanso, sábado foi dia de “graduation”, de “formatura”, como lhe queiram chamar. Os residentes estão a terminar o seu internato, os fellows também e tudo isso é pretexto para um jantar de gala. Até aí nada de novo. Até porque em São Francisco fui convidado do António e da Karen. Aqui é ainda mais sério. O dia é todo ele dedicado à promoção da excelência do departamento. NYU excels itself. Não tive acesso ao jantar de gala, o que neste caso particular agradeço. Mas tive que estar de manhã numa reunião onde os residentes apresentaram os projectos científicos. Logo às 7.30. Depois dum pequeno almoço também ele de gala. Na audiência estavam nomes com Naidich (122), Schweitzer (226), MacGuinness (59) , Bosniak (141), Balthasar (146), Megibow (133), Macari (78), Grossman (291), Knopp (49) entre outros. Tudo gente com toneladas de artigos e muita ciência publicados. Daqueles que têm nomes de doenças, critérios ou scores de classificação com o nome próprio. Durante horas ouvi gente a debitar investigação e gente consagrada a ouvir, a interpor, a questionar. Os números entre parêntesis traduzem o número de artigos publicados que resultam duma pesquisa rápida na “pubmed”. Tudo artigos com arbitragem científica. Impressionante. Ou talvez não, ao que estes loucos trabalham.

Sábado foi também noite de aniversários. De portugueses, entre portugueses e nova-iorquinos. Sejam eles autóctones, portugueses ou de outro lado qualquer.

Domingo foi para ressacar. E maldizer o raio do cirurgião plástico que me acordou às 9 da manhã, dizendo que passavam da uma. Alguém que lhe diga que são cinco horas de diferença.

Os primeiros meses são sempre os mais difíceis. Os outros, o resto, fica por contar. Já me sinto quase a partir. Estou quase nos Açores!

1 comentário:

Anónimo disse...

O nosso serviço também tem as suas sumidades!
Por exemplo , jmg (318) e NM (1204), entre parenteses, as conferências e memorandos, com a prof no corredor do fundo.
De fora, à espera de feedback ou queixa conforme o caso, ficam as análises científicas, empíricas ou meramente inclassificáveis às gajas do 01 e 02...